Até hoje vemos a dificuldade entre os homens detentores de posições
públicas conseguirem distinguir entre o público e o privado. "Falta
ordenamento impessoal que caracteriza a vida no Estado burocrático”.
A contribuição brasileira para a civilização foi então, o
“homem cordial”. Mas o que significa ser um homem cordial no contexto abordado
pelo historiador? A princípio, o adjetivo "cordial" gerou muitas
querelas. Os conservadores da época acharam que associar o brasileiro à imagem
de um "homem cordial" parecia desvirilizante, e o melhor seria encaixá-lo
no protótipo de um Cavaleiro da Esperança, ou coisa que o valesse.
Com o tempo, a polêmica cedeu lugar a um entendimento
parcial do que significava, para Hollanda, a cordialidade do brasileiro que, ao
contrário do que superficialmente possa parecer, não quer dizer apenas sincero,
afetuoso, amigo. As paixões – egoístas e desgovernadas – estão na origem do
conceito: trata-se de um homem de "fundo emotivo extremamente rico e
transbordante", segundo Sérgio Buarque de Hollanda, ou seja, um homem
dominado pelo coração (cor, coração em latim).
Este fundo emotivo que faz com que o homem cordial acredita
que para conquistar um freguês é necessário fazer um amigo. Possui um sentimento
mais humano e singelo, fazendo uso de um culto mais amável e fraterno, opondo-se
ao “Deus Palaciano”,
pregado nos tempos antigos e tendo aversão ao ritualismo, com uma religiosidade
de superfície.
A impossibilidade que o brasileiro tem em se desvincular dos
laços familiares a partir do momento que esse se torna um cidadão, gerou o
“homem cordial”, que tem horror a distâncias. Esse homem cordial é aquele
generoso, de bom trato, que para confiar em alguém precisava conhecê-lo
primeiro.
A intimidade que tal homem tem com os demais chega a ser
desrespeitosa, o que possibilitou chamar qualquer um pelo primeiro nome, usar o
sufixo “inho” para as mais diversas situações e até mesmo, colocar santos de
castigo. O rigor é totalmente afrouxado, onde não há distinção entre o público
e o privado: todos são amigos em todos os lugares.
O Brasil é uma sociedade onde o Estado é propriedade da
família, os homens públicos são formados no círculo doméstico, onde laços
sentimentais e familiares são transportados para o ambiente do Estado, é o
homem que tem o coração como intermediário de suas relações, ao mesmo tempo em
que tem muito medo de ficar sozinho.
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